8/21/2008

Espírito Olímpico?

A participação portuguesa nos Jogos Olímpicos de Pequim tem se destacado mais pelas declarações de alguns protagonistas – e outros que deviam ser meros figurantes – e menos pelos resultados obtidos.

Após promessas irresponsáveis de resultados magníficos por parte de atletas, responsáveis e governantes, instalou-se um sentimento de profunda desilusão e comentários a roçar o miserabilismo.

Tendo em conta que os Jogos apenas terminam no próximo domingo, um balanço apenas deveria ser feito nessa altura, quanto mais não seja para não pertubar os atletas ainda em competição.

O judo trouxe as primeiras desilusões e as primeiras declarações polémicas, com os resultados aquém do esperado (e prometido) a originarem desculpas esfarrapadas e acusações aos árbitros bem ao estilo do futebol.

Às palavras infelizes de atletas como Marco Fortes e Vânia Silva responderam o presidente do COP, Vicente Moura, e Vanessa Fernandes com declarações também elas desnecessárias e proferidas a destempo.

Criticar a falta de brio e profissionalismo dos atletas sem citar nomes cria um clima pesado entre a delegação portuguesa e é uma atitude injusta para com a esmagadora maioria dos presentes em Pequim.

Nesse aspecto, Vanessa surpreendeu pela negativa, uma vez que não se lhe ouviu qualquer crítica antes de conquistar, com grande mérito, a medalha de prata no triatlo. Presume-se que – e bem – estava concentrada na sua prova...

A sensação que fica é a de que a triatleta pretendeu ajustar contas com alguns dos colegas, pois não se percebe o discurso de que é necessário lutar por fazer o melhor e alcançar resultados prestigiantes e depois elogiar um 45º lugar no triatlo masculino.

O enfoque nos custos para os contribuintes da participação em Pequim surge totalmente a despropósito. Alguém se lembrou dos custos da ida da Selecção nacional ao EURO2008 para um resultado muito abaixo do esperado?

Aliás, o futebol parece sempre um mundo à parte. Se o Sporting de Braga perder com o Barcelona numa competição europeia é aceitável porque «basta olhar para as diferenças de orçamento, etc...». Mas alguém sabe quais as diferenças de condições entre os nossos atletas presentes em Pequim e os adversários vindos de países que são potências mundiais nas respectivas modalidades?

Ou alguém acredita que temos praticantes de ténis de mesa, badminton ou saltos com trampolim a treinarem nas mesmas condições que os atletas que conquistaram medalhas nessas modalidades?

Ninguém duvida que as condições para os atletas têm vindo a melhorar em Portugal, daí a dimensão da delegação olímpica em Pequim – todos eles cumprindo os mínimos do COI e, nalguns casos, os critérios ainda mais apertados fixados pelo COP.

As medalhas, muitas vezes, surgem quase «por acaso», bastando lembrar a brilhante prata de Sérgio Paulinho em Atenas2004.

Se os portugueses estão de facto preocupados com o dinheiro gasto no desporto deviam antes interrogar-se porque é que os estádios construídos para o EURO2004 não têm pistas de atletismo (para não falar do facto de, actualmente, quatro desses estádios estarem fora da Liga principal). Ou porque é que o Sporting não tem pavilhão próprio ou piscinas.

Admito, contudo, que alguns atletas tenham ido a Pequim com a sensação de já terem cumprido o seu dever. Isto não é aceitável, tal como não é aceitável arranjar múltiplas desculpas para maus resultados. Também aí, Naide Gomes mostrou ser uma verdadeira campeã. No mínimo, pede-se aos atletas que batam recordes pessoais ou nacionais, nas modalidades em que isso é possível ou que dêem mostras de se superarem. Lembram-se da presença dos portugueses no Mundial de Râguebi? Aí ninguém comentou que «se era para perder mais valia não irmos»...

Aliás, já pensaram que se calhar a presença em Atenas2004 de Nelson Évora, então com 20 anos, que se saldou por uma eliminação na qualificação com a marca de 15,72 metros, terá ajudado o atleta a melhorar o espírito competitivo e a iniciar uma ascensão que o levou ao título mundial do ano passado, com 17,74 metros?


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